quinta-feira, 11 de outubro de 2007

CARTA ENTRE AMIGOS
por Aline Yasmin

... Ontem engoli água do mar... foi bom. Por mais engasgante que tenha sido, foi bom. Revivi sensações de moleque quando eu me jogava no mar e acabava engolindo muita água, muitos caldos... tenho revivido sensações de adolescência de infância. Acho que sou mais feliz hoje do que sempre fui. Eu quando moleque achava o mundo muito estranho. Hoje, acho-o mais estranho ainda, mas aprendi a amar essa esquisitice. Porém, minhas sensações mais profundas, que partem de cheiros e gostos, seja da chuva na grama, seja a amora da árvore, me remetem a sensações muito puras, porém, já sentidas... Aí eu tenho a impressão carnal de que já vivi todas as novidades sentimentais possíveis. Apesar de me sentir num momento incrível de relação com a pulsão do existir, tenho a impressão de que as coisas sentidas, já foram sentidas... Aí li um conto meu escrito há algum tempo e lá, um personagem expressa uma sensação minha: as nossas sensações de adultos, são reverberações das sensações vividas na infância e na adolescência ou há muita novidade de sensações??? Talvez ter filho (como você teve) traga novas sensações. É isso?

A meu amigo sobre sensações

Sabe, o filósofo grego Platão - de quem ultimamente tenho gostado muito, diria que existem as reminiscências - na verdade, idéias inatas que o homem contemplou em contato com os deuses. São lembranças de uma outra vida que o homem traz a tona em contato com a percepção das coisas. Depois disso tudo seria falso - ou apenas cópias do ideal (idéias perfeitas) e estamos falando do que imaginamos ser a vida real.
Existe também, creio eu, a perspectiva de que estamos em permanente construção. Claro que a significação de um caldo mudou, porque o mar também mudou pra vc. Nós mudamos para o mundo e isso faz com que o mundo mude também e o que parecia esquisitice, se tornou seu domínio. Vc o percebe e é maior do que ele, porque agora pode aceitar ou negar, gostar ou não. Essa parte é muito importante. Isso muda o nosso olhar. Não temos como rejeitar o fato de que somos únicos e que o sentimento é altamente subjetivo - quer dizer, quem determina é o sujeito na sua relação com o tempo e o espaço. Essa sensação pode não ser a mesma sempre. Um caldo, um cheiro, um prazer específico ou uma dor podem assumir dimensões ou intensidades absolutamente diversas no decorrer da nossa vida. Creio que o que determina é o momento vivido. Um filho pode ser recebido de forma distinta do outro. Comprar um objeto desejado pode ser para alguém o mesmo sentido de ter um filho - não em valor (claro!), mas em ter alcançado algo que gostaria muito. Pode ser que um filho seja ruim, uma notícia negativa para alguns a ponto de desejar matá-lo (como temos visto na mídia). Enfim, não dá para prever o que seja realmente novo enquanto sensação. Pode-se inclusive nos revelar algo a que convivíamos sem perceber, até estarmos propensos a esse despertar. E aí, tudo novo de novo....como diz o grande poeta Paulinho Moska.

2 comentários:

Simone Couto disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Simone Couto disse...

a vida é um relembrar e um comparar eterno. Isto pra mim é Platão. A sombra, o alcançar do belo, do impossível, seja lá um objeto, um filho, uma sensação da infância. O grande segredo da felicidade está contido em nossas atitudes, em como lidamos com a jornada e com o prêmio alcançado. Este é o aprendizado que vale à pena abraçar com gosto.