domingo, 14 de outubro de 2007

Os Iluminados Efêmeros do Soleil
(dedicado especialmente à atriz Juliana Carneiro da Cunha)

Por Aline Yasmin


Depois do espetáculo eu e Caê – embora exaustos – não conseguíamos dormir e ainda que precisássemos acordar cedo para o primeiro vôo, procuramos um canto onde pudéssemos transbordar todos os pensamentos que nos contornavam. Estávamos embebidos de imagens e referências pessoais. Era preciso falar delas.

O ir e vir mental foi um deslocamento inevitável até aqueles instantes onde tudo nos pareceu sublime. Sublime no sentido dor. O belo e o sublime se divergem nesse sentido – e o último nos parece mais tocante. Talvez pudesse dizer que seja uma superação. É mais.

Os efêmeros estavam em todos os lugares. Não há como ignorar (plagiando a grande diretora Ariane Mnouchkine) também a sua platéia. Notáveis e anônimos que se viveram durante longo tempo, compartilhando sentimentos e olhares, tais quais cúmplices desta história – fomos uma massa entrelaçada e orquestrada magistralmente pelos iluminados atores do Soleil. Também fomos efêmeros. Choramos e rimos juntos – fomos únicos e não somos mais. Fomos conjunto cena – platéia – arquibancadas – aromas - texturas - sabores - água.

O espetáculo é tudo. Impressiona-me não somente as personagens e histórias construídas, mas a concisão de tudo que nos circunda. Impressiona-me o ator que limpa o chão com a mesma dignidade com que entra em cena, o olhar daqueles que movem as estruturas - quase como extensão cenográfica (mas ao mesmo tempo absolutamente incógnitos), a atenção do grande regente a cada gesto, a sincronicidade das cenas, a leveza e a densidade e o virtuoso processo – que mais podemos chamar de generoso – em nos proporcionar o contato mais profundo com o que chamamos humano. Fomos Humanos aos nos depararmos com a fragilidade do que somos, ao tocarmos de perto fragmentos de nossas vidas. Nos identificamos ao certo com tantos e é isso que universaliza nossa particularidade: a solidão, a fome, a espera, o desejo e a memória.

O vôo chegou na hora prevista em Vitória. Ao chegar em casa, dormi. Sonhei com Os Efêmeros. Os frequentei tanto quanto os fizeram em mim. Revisitei palavras – em francês, língua adormecida que sorvi como o delicioso iogurte - dialoguei com alguns e a outros acariciei. Compreendi a imensidão de nossa finitude e que para ela nem precisariam palavras. Bastaria a dignidade de Sandra, a busca de Jeanne, o altruismo de Manon, a superação de Gaëlle, o olhar da Perle e o gesto da Nelly, diante de tantos outros gestos como linguagem e significação – sinais de nossa vã existência – sem os quais nada representaria.

Um comentário:

Simone Couto disse...

ai como te entendo e divido com vcs estas sensações