segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Eu e o Mar
por Aline Yasmin

Hoje eu acordei cedo. Vizinha ao mar, ainda que tivesse que muito a fazer, o céu azul me convidava e resistir me levaria à culpa. Lembrei-me de um amigo que disse ter estudado teogonia....e depois que precisava me ensinar a meditação dos 04 elementos. Eu pensei... Pensei nos quatro elementos e em mim, o quinto. Lembrei-me da sequência de Luc Besson, do futuro, dos olhos azuis da atriz e de um momento onde ela salta acrobaticamente. Senti inveja do seu salto. Salto livre como se o corpo fosse de seu total domínio - e de fato era.

No meu, somatizo – sem controle.

Ir a praia ao domingo pode não ser uma experiência transcendental. Um homem de meia-idade gritava a sua filha: " burra, idiota, com quase 15 anos e nem sabe passar um protetor"...olhei com olhar de espanto, enquanto interrompia minhas leituras sobre a cultura e filosofia..corpo branco, óculos grandes, 04 quilos a mais, biquíni preto e branco...cabelos loiros (essa parte destoava do resto)... respirei fundo quando o tema virou antropologia. Os seres humanos me impressionam pela distinção entre si.

Bem, sonho em ter uma multidão interessada no que os antigos pensavam e sempre acho que poderia ter uma platéia acompanhando o texto que tanto me interessa - sonhos peripatéticos, diria Aristóteles... Todos ali, reunidos na democrática ágora da praia pública. Delírios. A cena, clássica remontaria a Atenas ou ao hilário grupo britânico Monty Python numa leitura contemporânea. Infelizmente a filosofia empoeirou sob o olhar ignorante ou academicista dos nossos tempos. Filosofemos galera, ao meio-dia.

Ontem, a noite, me senti livre. Liberdade é estar sentada num mirante enquanto todos chegavam animados para sua festa no espaço vizinho (um clube tradicional)..eu ainda exibia orgulhosa meu pareô e um velho caderno onde ansiosa imprimia meus últimos pensamentos antes que escapassem mar adentro.

Interessante a racionalidade, mas o que me tirava do conteúdo era o perfume que passava. Perfume me desconcentra. Gosto de perfume bom. Bom é aquele que não foi feito por acaso..tem cuidado, essência e tudo que tem essência...tem substância, vem antes... Gosto de substare.

Bom e belo são dois conceitos perigosos. Sempre repenso quando uso esse tipo de argumento. Não tenho a menor pretensão em estabelecer parâmetros. Cada um que o faça - mas, por favor, faça...nada me incomoda mais do que não reconhecê-los, ainda que como diz o velho amigo maluco beleza: ..." eu prefiro ser aquela metamorfose ambulante" ..ocupo-me em revê-los se assim o quiser.

Volto-me ao aroma que me percorre...Tem dias que algumas obsessões me incomodam. Seria mesmo necessário fixar-me no mirante na tentativa de distinguir entre um perfume e outro? O olfato me rompe. Alimento-me do olhar. O alquimista do Patrick Suskind e seu Perfume me atordoaram por um bom tempo. Atordoam-me os sentidos. Atordoa-me a beleza, o gosto, o medo, a água que molha - gelada - meus pés.

A razão me apavora. Não tenho como fugir dela.

Ainda que me atravessem todos os aromas do mundo, ainda que devore o mundo com o olhar, ainda que minhas mãos sejam plenas...

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